Este post será um pouco diferente dos que tenho postado aqui no blog, pois é mais como uma reflexão e desabafo sobre o que vem depois da decisão de mudar de país. São os sentimentos de quem está no Brasil, sabendo que vai deixá-lo, e o que vem como consequência disso.
Serve especialmente a quem tem os mesmos medos que tivemos (e ainda temos), pois talvez a identificação com os sentimentos relatados faça se sentir normal e no caminho certo. Também é direcionado a quem vai ter uma pessoa querida mudando de país, para tentar fazer entender o ponto de vista dela.
Os sentimentos de quem decide ir embora
Com a decisão de mudar de país, as mudanças em sua vida já começam a fazer efeito desde o Brasil. Sabemos que a jornada da imigração pode ser longa, como é a nossa (há 2 anos nela, e talvez dure no total 3 anos ou pouco mais), e nela já percebemos mudanças internas e externas (logo explicarei o porquê). E quanto mais longa essa espera de sair do Brasil é, mais intensos ficam os sentimentos e essas mudanças.
Desde que decidimos sair do país, em meados de 2015, sabíamos que, com isso, estávamos abrindo mão de tudo o que era conhecido e cômodo para nós. Com as pesquisas, descobrimos os detalhes dessa perda: a convivência com a família e os amigos, a facilidade de comunicar-se apenas em sua língua materna, a cultura, o tipo de alimentação e mesmo as coisas mais simples do dia a dia que são conhecidas pra nós – coisas que só saberemos no Canadá.
Sei também que as relações com pessoas amadas no Brasil vão se transformar (e de certa forma já mudaram), talvez em algo mais frio se alguma das partes não mantiver contato, e que as tristezas serão ocultadas pelas partes para preservar o outro. Isso muda muito a relação e a intimidade. E que, quando eu tiver filhos, estes não terão a convivência que eu gostaria com os avós e tios – os quais sentirão falta disso.
Então, embora tomar essa decisão seja algo libertador, é algo que também machuca em alguns pontos.
Quem está em dúvida sobre sair do seu país deve ter tudo isso em mente, além de ter de responder sinceramente, após uma longa reflexão: está mesmo disposto a deixar tudo isso pra trás? A resposta deve ser positiva caso queira seguir adiante com esse plano.
Porém, mesmo sendo positiva agora, pode mudar depois no outro país. Ninguém está livre de arrepender-se. Já vi relatos de pessoas que não conseguiram seguir adiante com tais planos por todos os motivos que citei. Então, tem que também estar ciente que o arrependimento pode acontecer.
Não é uma mudança fácil e é preciso muita coragem e persistência. Por isso é necessária uma alta dose de conhecimento sobre o país onde quer viver, e, com isso, ter mais certeza de que você e sua família podem ser felizes nele. (É por isso que fiz questão de indicar os blogs e vlogs que gosto, para todos terem acesso à realidade canadense sob diferentes pontos de vista.)
Resumindo, para aceitar essas perdas é preciso acreditar que os ganhos compensarão. É, de fato, um investimento sério: você paga não só financeiramente, mas com coisas de alto valor da sua vida até então. A torcida, é claro, é que o retorno do investimento aconteça, com outras coisas ganhando e confirmando maior valor do que se tinha antes.
Meu marido e eu acreditamos que seremos mais felizes ao morar no Canadá e que nossos filhos têm mais chances de ter um ótimo futuro por lá, por todos os motivos que citei em outro post – mas só o futuro dirá. Por isso, digo novamente que nós estamos investindo nisso. Todos que tomam essa decisão investem alto, por isso é uma fase que reúne um misto de sentimentos, que podem ser: esperança, medo, ansiedade, euforia, tristeza, insegurança, etc etc etc.
Essa etapa também significa mudanças internas e anseio para ir logo, pois é como estar próximo de um fim de relacionamento com o seu país de origem: você já não se vê mais nele desde antes de ir, e nada nele faz sentido mais.
Pra mim, ainda, que descobri que quero mudar de profissão e que ela não valerá no Canadá, é como se estivesse numa “pausa” na minha vida, e que talvez ela volte a fazer sentido apenas no Canadá, onde todos os meus planos estão focados. É como se eu vivesse a realidade de um lugar onde não estou fisicamente, até finalmente eu estar. É a mente separada do corpo, praticamente. Creio que isso seja natural, mesmo que em dose menor, em todos que decidem imigrar.
Enfim, junto aos sentimentos mistos que mencionei, há essas percepções sobre onde você vive, pois sabe que logo não estará mais ali.
Os sentimentos de quem fica (e não aceita)
Parte dos sentimentos negativos vem da não aceitação ou entendimento de parte dos entes queridos. É esse um dos pontos das mudanças externas que ocorrem após a decisão, pois caso você conte para amigos e familiares, o tratamento deles com você pode mudar para melhor (te agradam mais e apoiam seus planos) ou pior: passam a te ignorar, ou criticar sua decisão, ou mesmo fugir do assunto e fingir que tudo está como antes, o que faz com que seu caminho seja mais solitário.
A sensação que fica quando o sentimento de uma pessoa querida é negativo dessa forma (especialmente pais, avós e irmãos), é que ela acha que fazemos isso por egoísmo, ou por não amá-la e não querer ficar perto dela fisicamente. Por isso, quando essa pessoa não aceita a decisão, dói profundamente, pois você a ama e o que mais queria é ter a tão buscada felicidade perto dela. Nós, se pudéssemos, levaríamos as pessoas amadas junto, mas nem sempre é possível, por diversos fatores que não controlamos.
Mudar de país é um ato egoísta?
Uma vez eu conversei com uma psicóloga justamente essa questão de mudar de país e a relação com quem não entende isso, e fiz esse questionamento: será que estou sendo egoísta? A resposta dela foi simples e direta: não, e me disse que a busca pela felicidade não é egoísmo; segundo ela, egoísta é aquele que interfere na felicidade do outro, e faz todo o sentido.
Entendi ainda melhor o porquê da busca pela felicidade não ser um ato egoísta. Sendo felizes, fazemos do mundo um lugar um pouco melhor, de diversas formas. A nossa felicidade não serve apenas para nós mesmos, pois ela reflete à nossa volta.
O que você transmitirá ao mundo sendo infeliz, por meio das pessoas que estão próximas? Isso aconteceu comigo e ainda acontece, pois o que busco ainda não alcancei, e sei o quanto essa “infelicidade momentânea” é tóxica pra mim e, consequentemente, pra quem convive comigo.
Acredito que buscar a nossa própria felicidade é também uma forma de melhorar as nossas convivências, e se todos fossem felizes nesse mundo e convivessem em paz, teríamos um mundo muito melhor. Então é algo que faz sentido e é quase que um dever para todos.
Por isso, repito: decidir mudar de país não é egoísmo, apenas aos olhos dos que realmente são egoístas. E é triste perceber que pessoas amadas podem, sim, ser egoístas por esse ponto de vista. É uma das percepções que temos ao querer morar no exterior, e que queremos mudar durante muito tempo nessa jornada enquanto estamos no país. Digo por mim: tento sempre fazê-las entender minhas motivações, mas nem sempre tenho sucesso. E aí a tristeza bate mais forte.
O que quero dizer a quem decidiu morar em outro país também: você não está sozinho. Se o seu sonho e esperança de vida melhor é este caminho, siga-o, mesmo com os medos e as inseguranças. Tudo isso está ocorrendo comigo, e sei que com você também pode acontecer. Estamos juntos!
Caso você seja parente ou amigo de quem irá morar fora…
Você também não está sozinho, afinal, muita gente passa por isso. E quem passa por isso sobrevive muito bem, por meio de ligações, Skype ou outros tipos de comunicação online com câmera, recebendo em casa a pessoa querida todo ano ou outro período de tempo, e também com a oportunidade de você visitar sempre que puder o lugar que ela adotou, com a tamanha dificuldade de deixar a terra natal pra trás. Há várias soluções para isso, portanto, essa mudança não precisa ser negativa.
E, especialmente, o que quero dizer a você é: saiba que essa pessoa te ama e não tomou essa decisão para te machucar. Ela está apenas buscando o que certamente você buscou durante sua trajetória, que é a felicidade, e o caminho até a felicidade dela não é o mesmo que o seu – assim como o seu caminho deve ter sido diferente do caminho do seus pais, o deles diferente que o dos seus avós, e por aí vai.
Então, apoie essa pessoa se você realmente a ama. Esse momento é, com certeza, igualmente ou mais difícil para ela que para você. O seu apoio diminuirá o sofrimento dela e, com isso (se você a ama de fato), o seu. Afinal, quem ama de verdade quer ver o outro feliz. Isso não é algo clichê, é fato.
Ficar próximo não só fisicamente, mas no dia a dia, apoiando e acompanhando essas mudanças, fará o relacionamento de vocês melhor. E você também pode ter novas e boas experiências com isso.
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É isso. Queria desabafar sobre o meu ponto de vista e o que tenho passado, para ajudar um pouquinho essas duas partes da história de mudança de país. Também servirá para eu ter como lembrança já no Canadá, como uma força extra pra não desistir (pra eu lembrar o tanto que investi), pois lá terei outros tipos de conflitos internos e externos – uma outra fase complicada da imigração, com certeza.
Coragem para persistir no que se acredita: é o que desejo para você e para mim. Afinal, até onde sabemos, a vida só se vive uma vez.
17 comentários
Vivi, vc se expressa muito bem. Seu desabafo nos serve estimulo. Obrigado. Sucesso.
Obrigada Moacir, fico feliz que tenha gostado! Sim, precisamos de muitos estímulos, pois a mudança não é fácil. Mas vale a pena tentarmos ser mais felizes, né? Um abraço e sucesso em seus planos!
Super gostei, ainda não me preparei, mas quero morar no Canadá depois que terminar a faculdade. Obrigado pela dose de ânimo.
Abraços e sucesso!
Obrigada! Fico feliz em ajudar de alguma forma. Com planejamento da tudo certo! Boa sorte! 🙂
Olá Vi,
Compartilho dos teus sentimentos. Já morei fora por alguns anos, mas voltei ao Brasil e agora pensando em mudar definitivamente do país, no entanto a maior angústia é a de contar para a família. Como prepará-los para receber a notícia?
Abraços.
Olá Lilly! Pois é, acho que é a situação mais difícil emocionalmente do processo porque lidamos com nossos sentimentos e principalmente com os dos outros que amamos, e eles são imprevisíveis. Pelo que percebi, não há muito preparo a quem não compreende os motivos de sair do país. É o tipo de gente que sempre vai lidar negativamente com a situação. E há quem entenda e apoia. Temos os dois tipos em nossas famílias, e os que não compreenderam de início não compreendem até hoje, enquanto os que apoiaram continuam torcendo pela gente. Vai muito de cada um. O jeito é chamar pra conversar sinceramente e explicar os motivos, deixando claro que é pela sua felicidade e seu bem, e torcer para as reações serem positivas. Se não, fazer o que, paciência. Só não podemos deixar de realizar o nosso sonho, né? Cada um corre atrás do que acha melhor para si, assim como eles também fizeram, e eles devem respeitar a nossa escolha.
Abraço!
Estou lendo esse texto em 2019… na busca de consolo por meu namorado ter decidido sair do Brasil.
Ler isso acalentou meu coração, apesar de estar sofrendo na preparação da mudança e devo sofrer mais ainda após, o texto coroborou com que pensava prefiro vê-lo feliz longe do que infeliz aqui, apesar de saber disso dói pra quem fica.
Agora, em 2021, estou passando pela mesma coisa. Ele decidiu se mudar para Inglaterra e me propôs ir junto. Não quero largar minha faculdade e família, para embarcar nessa. Dói muito ver a preparação dele para ir atrás desse sonho, sei que vou sentir muitas saudades e por um tempo vou viver uma espécie de “luto”. Entretanto, cada um deve viver sua vida livremente. Eu tomei a decisão de ficar, ele de ir e espero que ambos sejam felizes!
Eu tenho planos, já bastante concretos, de ir para a Alemanha em 2021. Meu pai é falecido e tenho muito receio de deixar minha mãe, de 70 anos, sozinha no Brasil. Tenho muita vontade de ir, mas também tenho muito receio. Meu maior medo é que algo aconteça com ela enquanto eu estiver longe.
Olá Marcos! De um lado não podemos deixar nossa vida parada ou deixar sonhos de lado, pois agora é a nossa vez de fazermos o nosso caminho. Ao mesmo tempo, é altamente desafiador como conciliar os nossos planos com as pessoas que amamos e não podem ir junto conosco, né? O que posso te dizer é para tentar encontrar um meio termo, um jeito de seus planos não afetarem tanto sua mãe e consequentemente a você mesmo. Talvez combinar de levá-la a cada X meses, ou você volta e vai intercalando isso, etc. É uma questão muito pessoal e só você poderá pensar na melhor forma de lidar com essa situação. Mas saiba que não é o único, não está sozinho, e é inevitável a quem tem planos de morar fora que passe por situação parecida. Pense com carinho e achará uma solução.
Desculpe Vivian, acho um pouco egoísta sim, no meu caso minha irmã está indo embora com meus sobrinhos, sem necessidade pois elea tem uma vida muito muito confortável aqui. Vai deixar eu e minha mãe de 75 anos, acho mto egoísta, nunca largaria a minha mãe, sabendo q se ela morrer não estarei por perto. Não temos pai, tio, avô e avó, todos já se foram. Então somos nós apenas.. Eu apoio a decisão dela sim, óbvio, mas internamente acho mto egoísta sim.. Até pq ela não precisaria sair do Brasil em busca de uma condição de vida melhor, já ela já tem mtas posses. Concordo sobre qualidade de vida pros filhos, isso é fato.. Mas abandonar fisicamente a mãe é um ato egoísta sim. Não tem como tampar o sol com a peneira.. Me desculpe
kkkkkkkkk voce fala que apoia a decisao dela, mas passou o comentario inteiro falando mal dela?
Sinto muito que voce nao queira sua irmã longe, mas a felicidade dela não pode ser baseada no que voces acham melhor, e ao mesmo tempo voces nao podem depender dela para a propria felicidade.
Extremamente cruel seu comentario falando que ela esta “abandonando” a mãe, isso é uma mentira. Ela esta seguindo a propria vida, nao tem a menor obrigação de colocar a sua felicidade, ou a da sua mãe, na conta. Se voces dependem dela para serem felizes, algo esta muito errado na sua dinamica familiar.
“Me desculpe”
Meu marido aqui no Brasil para conseguir uma estabilidade financeira mudou várias vezes em várias cidades diferentes. Assim foi eu com meus filhos. Estudando, trabalhando , eles se casaram. Enfim tenho 3 filhos e netos, 1 filha mora a 4 anos com meu genro e 2 netos em Portugal. Senti muito a falta deles mas estão bem lá. Meu esposo tem mais 2 filhos do seu primeiro casamento que também moram lá. Estão muito bem também. De férias os filhos que estão em Portugal se uniram e nos deram a passagem de ida e volta. Fomos agora recentemente .Ficamos 3 meses em Portugal. Lugar incrível, tem governantes, não está a mercê da violência como infelizmente nosso país. Meu esposo conseguiu até trabalhar na área dele. Pois aqui no Brasil com 70 anos vc não existe mais. É aposentado e pronto. E por esse motivo ele amou Portugal. Agora quer ir embora para lá. Eu sinceramente amei passear lá, mas morar não quero. Meus filhos e netos até orientei que realmente para criação e estudo dos filhos não tem lugar melhor. Mas eu absolutamente vou só para passear. Já criei os filhos. Meus pais sonda estão vivos. Não quero perder a oportunidade de estar mais próximos deles neste momento. Embora moro no Interior de São Paulo e eles na capital. Meus pais tem cuidados especiais mas meus irmãos cuidam deles e muito bem. É algo dentro de mim que fala mais alto…Talvez se eu fosse mais jovem teria ido com meus filhos pequenos. Pensaria neles. Mas agora quero estar por perto dos meus pais…aqui sempre que eu quizer poderei vê-los. Mas se vc está começando agora, tem ou irá começar a ter seus filhos, um ótimo lugar para criá-los é Portugal. Ótimos estudos, longe da violência, ótimas amizades e uma língua fácil de entender. No meu caso fiz a vontade do meu marido a vida inteira, agora farei a minha. E que Deus abençoe a todos!
Estou lendo aqui agora hoje 22/03/2022 as 13:34 a pessoa que eu amo embarcou para Estados Unidos pra ficar la 1ano e meio ( no minimo) e o sentimento é de felicidade por ele esta realizando oque tanto sonhou e tambem de coração apertado por ele esta indo pra longe de mim. Seja o que Deus quiser , sigo com coração apertado aguardando seu retorno.
Obrigada Vi por compartilhar com a gente
Boa noite,Hoje é dia 3 de maio de 2022.Tenho um sonho de morar na cidade do México.Minha mãe é muito apegada a mim tem 76 anos.Não sei oque fazer.Peço a Deus força e direção.Estou feliz e ao mesmo tempo triste.
Obrigada Vi!!!
Foi muito acolhedor o que acabei de ler – hj em 2022.
O que percebi é que sempre terão pessoas que apoiam, mas mais ainda as que não apoiam e nos julgam e como dói isso, o pior é quando são pessoas beeem próximas… enfim o jeito é parar de “esperar” aprovação e seguir em frente se se mudar fizer sentido…
Boa tarde!
Gostaria de expressar minha mais sincera gratidão quanto à esse post. Eu tenho uma amiga, que na verdade nos chamamos de irmãs, pois é assim que sabemos que somos. Com 11 anos de amizade vivemos muitas coisas juntas! Conquistas, decepções, tristezas, luto, medos, alegrias, risadas, planos de Deus e enfim. Tudo o que a vida pode proporcionar! Há cerca de 2 anos eles (ela e o marido) oraram e decidiram ir embora do país, desde então sofri bastante na fase de negação, até aceitação e parceria com ajuda sobre tudo da ida deles. Mesmo na dor, faço questão de fazer parte de tudo e apoiá-la. Acima de todo meu egoísmo e desejo que ela nunca fosse embora, eu quero a felicidade dela. O começo foi muito difícil e o processo também está sendo, mas neste post pude perceber que estou no caminho certo e quero poder apoiá-la em tudo até o dia que ela embarcar no avião e nossos caminhos se descruzarem fisicamente. Obrigada!